O paisagismo é o campo de conhecimento e prática que se dedica à concepção, planejamento, transformação e cuidado dos espaços abertos e das paisagens habitadas. É uma área multidisciplinar que integra saberes da arte, da arquitetura, da ecologia, da botânica, da geografia, das engenharias e do planejamento urbano e regional, propondo intervenções que promovam qualidade ambiental, bem-estar coletivo e equilíbrio entre natureza e sociedade.
Mais do que o desenho de jardins, o paisagismo envolve a compreensão profunda dos processos ecológicos, culturais e territoriais que moldam os lugares. Atua desde a escala do detalhe, como um canteiro ou uma praça, até grandes territórios rurais e urbanos, reconhecendo que a paisagem é um sistema vivo, dinâmico e socialmente construído.
O paisagismo pode ser entendido como uma prática que articula função, forma e sentido: organiza fluxos, usos e vegetação; compõe espacialidades sensíveis e expressivas; e promove vínculos entre pessoas, territórios e ecossistemas. Suas aplicações incluem a criação de espaços públicos, a requalificação de áreas degradadas, o manejo de infraestruturas verdes, o apoio a processos de agroecologia urbana, e a valorização de identidades locais.
Em tempos de crise climática, desigualdades socioespaciais e colapso ambiental, o paisagismo se afirma como uma ferramenta fundamental para a regeneração dos territórios, a adaptação das cidades e o fortalecimento da justiça ambiental. Trata-se de uma arte ecológica e política, que projeta possibilidades de convivência mais harmônicas, diversas e sustentáveis entre seres humanos e o mundo natural.
A formação em Paisagismo na Escola de Belas Artes da Universidade Federal do Rio de Janeiro representa a convergência entre tradição acadêmica e inovação pedagógica no ensino da paisagem no Brasil.
É nesse contexto que o curso de Paisagismo emerge como expressão contemporânea da vocação artística, ambiental e projetual da EBA. Fruto de transformações curriculares e conceituais ao longo das décadas, o curso consolida-se como o primeiro bacharelado do Brasil voltado exclusivamente à formação de paisagistas, com enfoque multidisciplinar e compromisso ético com a transformação do território.
Integrando saberes da arte, da arquitetura, das ciências ambientais e das humanidades, o curso de Paisagismo oferece uma formação singular, voltada à criação de paisagens sustentáveis, inclusivas e culturalmente significativas. Mais do que formar técnicos ou especialistas, o curso prepara profissionais capazes de atuar de forma crítica, sensível e inventiva frente aos desafios ambientais, urbanos e sociais do século XXI.
A seguir, apresentamos o percurso histórico da formação em paisagismo na EBA-UFRJ, seus fundamentos, objetivos, estrutura pedagógica e perfil do egresso — evidenciando a relevância dessa graduação no cenário nacional e seu papel estratégico na construção de paisagens mais justas e habitáveis.
ESCOLA DE BELAS ARTES DA UFRJ
A Escola de Belas Artes (EBA) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) é uma das instituições de ensino artístico mais antigas e prestigiadas do Brasil e da América Latina. Sua origem remonta à fundação da Academia Imperial de Belas Artes, criada em 1826, durante o Primeiro Reinado, por decreto de Dom Pedro I. Esta academia foi o desdobramento institucional da Escola Real de Ciências, Artes e Ofícios, fundada em 1816 como parte de um projeto de modernização cultural do país promovido pela Missão Artística Francesa.
Ao longo do século XIX e início do século XX, a Academia formou importantes nomes das artes plásticas e visuais brasileiras, consolidando-se como um centro de excelência nas áreas de pintura, escultura, arquitetura, gravura e ornamentação. Em 1931, com a criação da Universidade do Brasil, a instituição passou a se chamar Escola Nacional de Belas Artes (ENBA), integrando oficialmente o ensino superior brasileiro como unidade acadêmica da nova universidade.
A partir da década de 1970, com a transformação da Universidade do Brasil na Universidade Federal do Rio de Janeiro, a escola passou a ser chamada de Escola de Belas Artes da UFRJ, ampliando seu escopo de atuação. Novos cursos foram incorporados, refletindo as mudanças culturais, tecnológicas e sociais que marcaram o ensino artístico no final do século XX. Com isso, a EBA/UFRJ consolidou-se como um espaço dinâmico de produção artística, pesquisa e inovação, preservando a tradição acadêmica e, ao mesmo tempo, abrindo-se para os desafios contemporâneos.
Atualmente, a EBA é um polo formador de artistas, designers, professores e pesquisadores das artes visuais, do design e da preservação do patrimônio, contando com uma rica estrutura de laboratórios, ateliês, museus e bibliotecas especializadas. Sua atuação transita entre a preservação da memória artística nacional e a produção de conhecimento crítico e criativo voltado para o futuro.
DAS ARTES DECORATIVAS AO PAISAGISMO
Fruto das transformações acadêmicas vividas pela Escola de Belas Artes no século XX, o curso de Composição Paisagística surge como desdobramento da antiga estrutura curricular voltada às Artes Decorativas, consolidando-se como um curso de graduação na década de 1970. Seu projeto pedagógico original refletia uma proposta inovadora para a época: articular os fundamentos da composição artística com saberes técnicos voltados ao manejo ecológico e botânico, em um diálogo entre arte, natureza e planejamento do espaço.
A formação, que se posicionava entre a arte e as ciências naturais, ganhou reconhecimento institucional com o registro e aprovação pelo Ministério da Educação (MEC) entre os anos de 1977 e 1979, formalizando sua atuação no sistema universitário brasileiro. Desde então, o curso se consolidou como um polo singular de ensino e experimentação no campo do paisagismo.
Entre as décadas de 1980 e 2010, o curso teve como docentes algumas das figuras mais relevantes no pensamento e na prática paisagística no Brasil, como Andrés Tomita, Carlos Terra, Robério Dias, Virgínia Vasconcellos, Lucia Maria Costa, Maria Elisa Feghali, Jane Santucci e Rubens Andrade. Esses nomes contribuíram de forma decisiva para a consolidação do curso como um espaço de reflexão crítica e prática criativa voltada ao paisagismo em suas múltiplas dimensões — estéticas, ambientais, culturais e sociais.
A partir de 2014, impulsionado por movimentos diversos — como o início do trâmite legislativo para o reconhecimento da profissão de paisagista no Congresso Nacional, a pressão do corpo discente e o amadurecimento de uma nova visão acadêmica por parte do corpo docente — o curso iniciou um profundo processo de reforma curricular. Esse processo foi marcado por intensos debates internos e consultas acadêmicas que culminaram, entre 2014 e 2019, na reestruturação completa do currículo e na mudança oficial de nome para “Paisagismo”.
Essa mudança não foi apenas simbólica: ela marcou a consolidação do curso como o primeiro e único bacharelado em Paisagismo do Brasil, reconhecido por seu caráter multidisciplinar e por sua capacidade de formar profissionais aptos a atuar de forma crítica, técnica e poética na transformação da paisagem.
POR QUE UM CURSO DE GRADUAÇÃO ESPECÍFICO EM PAISAGISMO?
Os projetos paisagísticos exercem um papel estratégico na promoção da qualidade ambiental e social das cidades, especialmente nos grandes centros urbanos. Do ponto de vista ambiental, contribuem para a melhoria da qualidade do ar e da água, para o aumento da permeabilidade do solo, para a redução das ilhas de calor urbanas, e para a recuperação de áreas degradadas. Socialmente, o paisagismo promove bem-estar, saúde e qualidade de vida, especialmente quando articulado a espaços públicos acessíveis, áreas verdes de uso coletivo e projetos terapêuticos que integram natureza e cuidado.
Apesar de disciplinas de paisagismo estarem presentes em cursos como Arquitetura e Urbanismo, Agronomia e Engenharia Florestal, a criação e manutenção de um Curso de Graduação exclusivo em Paisagismo se justifica pela necessidade de formar profissionais com uma visão holística, crítica e integrada do planejamento e projeto da paisagem.
Nos cursos de Arquitetura, o ensino do paisagismo geralmente se limita a uma base conceitual distribuída em um ou dois períodos, com carga horária reduzida e foco majoritário em espaços edificados. Já em cursos como Agronomia e Engenharia Florestal, embora haja aprofundamento nos aspectos de vegetação, manejo e gestão ambiental, o exercício projetual da paisagem não é foco central da formação.
Nesse contexto, o Curso de Graduação em Paisagismo da EBA-UFRJ ocupa um lugar único: preparar profissionais aptos a atuar com autonomia em todo o ciclo do projeto paisagístico, desde a leitura e diagnóstico ambiental e territorial até a concepção, detalhamento, execução e gestão de intervenções paisagísticas em diversas escalas e contextos.
Trata-se de uma formação que conjuga fundamentos conceituais, técnicos, ecológicos e estéticos, permitindo compreender a paisagem como um sistema vivo, socialmente construído, em permanente transformação. Os futuros paisagistas são capacitados a pensar o projeto como um processo contínuo e interdependente, que articula planejamento ambiental, regeneração ecológica, percepção estética, conforto ambiental e apropriação social dos espaços abertos.
Assim, o curso responde à crescente demanda por profissionais capazes de integrar projeto, ciência e compromisso ético no enfrentamento dos desafios socioambientais contemporâneos, contribuindo efetivamente para a construção de paisagens sustentáveis, resilientes e democráticas.